segunda-feira, 28 de março de 2011

The Walking Dead

Sempre gostei de zumbis. Os filmes do gênero sempre me cativaram e despertaram um interesse grande. Desde os tempos em que tentava achar um VHS do "The Night of the Living Dead", até os dias de hoje, em que volta e meia faço o streaming de alguma versão qualquer e assisto no computador - não adianta, a temática sempre me fascina. Sou fã inveterado do George Romero - deus-todo-criador da zumbizada como conhecemos nos dias de hoje. Apesar de alguns, por assim dizer, vexames nas suas últimas produções, o cara continua o cara. Romero é foda e ponto final.  

Há alguns anos vi que a Image havia lançado uma revistinha chamada The Walking Dead. A Image - editora americana outrora gloriosa e milionária -, que ainda luta para voltar aos tempos do auge de Spawn e toda uma franquia vencedora, nunca chegou a entusiasmar muito com suas publicações atuais. Mesmo seus carros-chefes, com o tempo, entraram em decadência. Nos últimos anos me impressionou a maneira com que Spawn simplesmente deixou de ter qualidade. Enfim, fui cético quando bati o olho com a revista do The Walking Dead. Não respeitei a publicação e tampouco me deixei convencer pela história que estava ali contada. Cheguei a aprovar a estética de um preto e branco elegante, que abusava das belas sombras; mas não li nem comprei o encadernado. Desse primeiro encontro faz 2 ou 3 anos. 


Quando estava na Europa, em um momento caseiro, comecei a ver o OmeleteTV, programa semanal de novidades e destaques do site www.omelete.com.br. Em razão do lançamento da série televisiva da AMC, baseada integralmente na banda desenhada, os apresentadores falaram bastante na franquia. Depois de ver alguns caras que respeito rasgarem elogios e mais elogios à saga zumbi, tanto no âmbito de história em quadrinho quando dos episódios em formato televisivo, decidi aceitar a derrota. Admiti ter menosprezado o trabalho de Robert Kirkman e encomendei o compêndio americano de 48 edições para ter a obra sangrenta em mãos assim que chegasse ao Brasil depois do intercâmbio na França, somente cerca de três meses da data que encomendei. Apenas comecei a ler a obra-prima faz umas duas semanas e fiquei orgulhoso da compra. Além de ser uma edição muito bem editada e luxuosa, é substancialmente mais barata que a versão brasileira.

A começo da trama é bastante simples, e até mesmo um pouco batido demais, mas é nesse ponto em que passei a subestimar a história para ser fortemente surpreendido. Apesar de existirem vários filmes e obras pop que se dedicaram a criar e a experienciar as mais diferentes situações de zumbis x homens, essa banda desenhada definitivamente inovou. O ambiente em que os sobreviventes se encontram cresce gradualmente para um nível descontrolado de violência visceral em que não é poupado nenhum sangue. Personagens surgem e desaparecem por meio de emboscadas de grupos de zumbis, sempre bem montadas e desenhadas pelos autores. Na velocidade que brotam no ambiente sombrio, os personagens são mutilados, dilacerados e mortos. 


Nessa capacidade de divertir o leitor que reside um dos méritos dos artistas. O inovador da série é que o enredo consegue aliar o gênero gore - com direito a muito sangue e com cenas de violência bem montadas -  a um roteiro excelente. Especialmente nas edições mais avançadas, as questões importantes da trama não deixem de ser robustas e muito bem trabalhadas. Chega um momento da evolução dos fatos em que os fatores são tantos que é difícil saber para que futuro que espera o grupo de não-infectados. As problemáticas crescem em complexidade e são esquematizadas pelo autor de forma original e interessante.

A originalidade reside no fato de que, diferentemente de outros trabalhos cinematográficos em que sempre se busca a cura do infecção ou o contato com o "Estado" a todo custo e se acaba o filme, pouco se sabe da situação geral do mundo e o foco é direcionado, pelo menos no começo da saga, para as relações sempre tensas entre os personagens do diversificado grupo. Em poucas palavras, uma revista que achei que seria meramente divertida algum tempo atrás, se tornou conversa de gente grande. Fiquei por muitas vezes com aquela vontade desenfreada de ler rapidamente as duas páginas em minha frente para poder logo virar para as próximas páginas e saber o que iria acontecer em seguida. É sempre uma bela surpresa encontrar uma dessas pérolas quando menos esperamos. Nunca canso de perseguir a sensação de felicidade que sinto quando me vejo às voltas com uma boa história em quadrinho, para assim poder me divertir e esquecer do mundo ao meu redor por algumas boas horas. 

Créditos da obra: 
The Walking Dead (Escrita e Criação - Robert Kirkman / Desenhos - Charlie Adlard)

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Clássico

Finalmente, depois de uma espera de 15 dias, vi a verdadeira elegância da onda de Supertubos. Estava suspeitando que a ressaca dos dias anteriores iria amainar e que a possibilidade de se pegar um Supertubos clássico era grande: a previsão indicava que o vento iria soprar em volta dos 8 km/h, em direção terral. Depois de enfrentar vários dias de sessão dupla por dia, já estava ficando muscularmente exausto. Alguns dias antes, tinha começado a fazer apenas um 'power surf' por dia, para assim ter um melhor rendimento e uma melhor explosão na água. Cheguei no pico com um amigo por volta das duas da tarde, ou seja, já com um crowd considerável na água. Apesar de não haver uma enorme multidão no outside, havia cerca de quarenta pessoas no line-up. Mesmo assim, corri para a água com força total e um sorriso no rosto.


Deixei minha câmera com o Dan, que estava com uma lesão no ombro, e corri para buscar meu lugar ao sol. Como o desempenho de Supertubos é sujeito ao sempre mutuante banco de areia, a onda nunca quebra no exato mesmo lugar e isso dá espaço para más interpretações quanto ao posicionamento dentro d'água. Apesar dos locais terem um sexto sentido quanto a quais serão e onde estarão as melhores ondas da série, e assim sempre remem nas ondas corretas, há sempre uma brecha para os turistas pegarem a boa onda da vez. Por vezes via tubos incríveis vindo em minha direção e havia algum nativo na preferência. Mesmo isso sendo uma incomodação, ao menos a imposição da comunidade local no outside era feita somente por meio de um surf de alta qualidade - nunca fui xingado, olhado com cara feia ou intimidado dentro d'água. Sempre que eu estava na melhor posição de drop fui respeitado, e da mesma maneira respeitei quem estava na posição inversa.

A água estava azul e com uma textura lisa apesar do leve sopro de vento, sentia como se fosse por aquelas duas horas que surf que eu tinha empreendido todo meu tempo, minha energia e meu dinheiro. A simplicidade desse momento e a adrenalina que flui pelas veias numa condição perfeita de onda são os fatores que fazem todo o esforço fazer sentido. Se as vezes me vejo divagando o porquê de estar ali, nessa eterna busca por prazer no oceano, é numa situação mágica desse tipo em que tudo se dissipa e a ansiedade é completamente dissolvida.

As ondas estavam descortinando para os dois lados - algumas tubulares, outras bastante verticais e corpulentas. Havia ondas para todos os gostos, e por isso consegui executar diferentes manobras para os dois lados. Surfei dois longos tubos, em outras ondas consegui rodar perfeitamente no 360˚. Tive uma tentativa de aéreo que, apesar de não ter acertado, foi bastante divertida. Se entrei no mar com um sorriso no rosto, saí dele de cabeça feita e um sentimento de missão cumprida. 








sábado, 5 de fevereiro de 2011

Amigos

Depois da intensidade dos primeiros dias de surf diário, duas vezes por dia, tirei um dia só para ficar em casa descansando; não perdi nada de muito interessante pois o vento estava forte. Foi muito bom dar uma trégua para os músculos, pois nos dias seguintes me senti cem por cento na remada e na linha de surf. Como o mar cresceu e comecei a surf com mais frequência, acabei por não atualizar muito o blog, mas mesmo nesse dia a preguiça bateu mais forte e nesse dia de folga não me animei em atualizá-lo. Todavia, foi imprescindível fazer algumas anotações diárias, para ter alguma referência sobre as andanças, senão teria posts cada vez mais confusos! 

No dia seguinte à recuperação física, decidimos ir até as praias do Ferrel ver o que esses picos mais afastados ao norte de Baleal nos reservavam. Fiquei espantado com a beleza do lugar, com muito verde e grandes paredões de pedra. A encosta parecia toda composta por arbustos, pequenas árvores e uma terra lamacenta. A composição selvagem da vegetação fazia lembrar as fotos do Algarve, nas praias do extremo sul de Portugal. Quase não acreditei que estávamos a apenas quinze minutos da capital do surf português, Peniche. Como é um beach break aberto ao vento, apenas em dias de pouquíssimas rajadas é indicado que haverá algo que valha a pena surfar. O mar estava gigante, mas fechava demais. Consegui remar até o outside mas as ondas não estavam lá essas coisas, foi um pouco frustante ver um mar tão corpulento sem condições favoráveis.         

Fiquei pensando comigo mesmo como deve ser perfeito ter um "motorhome" na Europa, apenas dirigindo pela costa, pronto para pular na primeira vala desconhecida enquanto a "casa" improvisada aguarda na beira da praia. Aqui na região é frequente encontrar peruas e motorhomes do Reino Unido, da França e da Espanha - que chegam a descer até o Marrocos em busca de ondas. 

Além da compania do Percy, esse amigo alemão que estou dividindo o hostel e o carro, nessa época fiquei amigo de um outro alemão, o Dan. Quando fomos visitar o Ferrel já estavamos saíndo para surfar os três juntos faziam alguns dias. Ele largou tudo que estava fazendo na Alemanha para tirar três meses de férias para viajar pela costa da Europa com a Emma, uma pointer linda. Ficamos muito amigos e ele ficou uns quatro dias a mais que o previsto aqui em Peniche. Acho que esse tipo de amizade intensa e passageira é uma das coisas mais confortantes dessas longas viagens; o sentimento de afinidade e de amizade somado à esperança de encontrar, em um furturo um pouco distante, essa pessoas uma outra vez. 

Nessa altura da viagem, completando mais de cinco meses de estrada, já deixa de ser frustrante conhecer pessoas por dias, semanas e meses para depois nunca mais vê-las. Mas acho que minha saúde mental, para não dizer sanidade, repousa no fato de ter ainda esperança de rever o punhado de pessoas que realmente fizeram a diferença nessa minha estada no Velho Mundo



sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Secret

Dia 7 ao 12 - As boas notícias começaram a vir quando a primeira ondulação brotou na costa. Quando estava sentado na praia, pensando em quão ridícula estava a situação do mar, conheci um alemão que passava de bicicleta pela praia. Começamos a conversar e nos demos conta que estávamos exatamente na mesma situação: desprovidos de um automóvel, sem um parceiro para o surf e com um plano de ficar por vinte dias em Portugal. Conversa vai, conversa vem, decidi me mudar para o hostel em que ele estava, no Baleal, praia vizinha dos Supertubos. Foi com certeza a melhor decisão que poderia ter tomado. No dia seguinte fomos para Lisboa alugar um carro, e daí em diante começou a vigília das ondas. 

Para acabar completamente com o meu hábito de dormir tarde a acordar tarde, a session matinal passou a ser às sete e meia da manhã - o que acarreta em acordar, precisamente, às seis e meia. Desse jeito, na procura das condições perfeitas, achamos até mesmo alguns lugares mais escondidos para surfar. Um dos lugares que fomos pegar onda pela tarde, de modo a escapar das multidões  de Supertubos com ondulação média-pequena: era uma prainha bem escondida e parecia ser insurfável, mas com a maré certa e uma direção de swell específica, abria-se uma direita de uma manobra só bem interessante. Começamos a acordar todos os dias cedo e ir direto para os Supertubos, para na tarde fazer um surf amigável nesse pico mais recluso. 

No decorrer desse dias o mar começou a melhorar muito, com ondas maiores e de melhor formação. No final das contas foi muito bom não ter quebrado tão grande nos dias anteriores, já que o condicionamento físico não estava ainda cem por cento. Quando a primeira ondulação atingiu Supertubos, pensei um pouco se entraria ou não na água, pois sabia que todos que estavam no line-up eram locais e que poderia me encomodar um pouco na escolha das ondas. Mesmo estando rodeado por bodyboarders portugueses, o clima foi imensamente mais tranquilo do que pensava que seria. A sensação de respeito imperava e cada um pegava a onda que lhe era devida.


"Keep it a secret, ok?"


A parte mais curiosa desses últimos dias de surf incessante foi o momento que fomos abordado por um surfista local nesse secret spot que falei anteriormente. Cuidadosamente, ele nos perguntou como tinhamos encontrado o pico e que deveríamos manter o lugar em segredo absoluto, pois era uma onda dos nativos de Peniche. Como eu me apresentei como brasileiro, portanto já falando em português, a conversa fluiu muito bem. Segundo ele, alemães, franceses, ingleses e dinamarqueses não respeitam ninguém na água, diferentemente dos brasileiros. Para completar, acrescentou que os franceses e ingleses são "uma raça do caralho". 




quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Nazaré

Dia 6 - Como o mar continuava absurdamente pequeno, fato estranho para o janeiro português, eu e o Rudy decidimos fazer o relatório das ondas do norte. Pegamos o carro e dirigimos até a famosa Nazaré. A única coisa que conhecia sobre este sítio era a fama de ser um pico com as melhores ondas gigantes de Portugal. Juntamos um punhado de esperança e visualizamos que a ondulação poderia encaixar melhor nessa região, a cerca de cinquenta minutos de Peniche. Apesar de ter encontrado um belíssimo vilarejo e uma beleza natural invejável, o mar continuava parado. Talvez o fator positivo tenha sido ter me deparado com uma paisagem propícia para a fotografia e consegui registrar alguns momentos interessantes. No final do dia acabamos voltando para o Baleal, onde acabamos por surfar um pouco. A maré subiu e acabou valendo a pena ter viajado o dia inteiro enquanto o mar se ajeitava para a session do fim de tarde. 

O ponto alto desse pacato dia foi a conversa com o Glauco, um dos homens que cuidava do albergue durante a semana. Ele é estudante de hotelaria e turismo aqui mesmo em Peniche. Puxei assunto sobre o clima que Portugal vive hoje: com uma situação econômica frágil, o país está prestes a ser praticamente obrigado pelos países membros da União Européia a pôr em prática um plano de austeridade nos moldes da Irlanda e da Grécia. Basicamente, acarretaria em um aumento nos preços dos produtos, uma diminuição geral dos salários da população, em cortes drásticos nos gastos da administração pública (a maior agravante sendo a demissão de milhares servidores públicos) e em uma submissão às diretrizes fixadas pelos países membros da UE. 

A tensão econômica e política é bastante latente até mesmo para meus olhos de turista. Por toda cidade há pixações que clamam por greves gerais e mobilizações cívicas. O que mais marca são os outdoors de associações civis e de sindicatos com mensagens mais ou menos nessa linha: "Enquanto eles roubam, nós é que pagamos?", ou "Que justiça é essa?". Ou seja, além do país viver uma inércia econômica, não conseguindo sequer atingir a meta de crescimento de 0,8% ao ano, a cultura de desvios de gastos públicos é aqui tão presente quanto no Brasil. 

É engraçado como as similaridades entre Portugal e Brasil saltam aos olhos diariamente. O que parece diferente é que o Brasil vive, hoje, seu momento de roubalheira e bonança; enquanto Portugal encontra-se prestes a jogar-se na fossa da crise e da estagnação econômica, sem deixar faltar os absurdos no campo da política. Procurei me inteirar sobre o passado recente do país, até mesmo para entender a situação e, principalmente, o período da ditadura. O Glauco me contou da impressão dele sobre o regime de opressão do Estado Novo. Com o mesmo nome do famoso regime de Getúlio Vargas, contou que foi um momento de pobreza, censura e tortura - com uma polícia política implacável. Fui pessoalmente dar uma olhada Museu da Ditadura na Praça/Forte de Peniche: foi enriquecedor ver de perto a propaganda fascista de Salazar, as acomodações onde aconteciam as visitas íntimas dos detentos e os fragmentos das leis que regulamentavam o estatuto dos presos políticos. 

Com uma forma de governo apoiada na doutrina social da igreja, em um corporativismo de Estado e em uma conduta econômica nacionalista e isolacionista, levou o país à inércia e a pobreza. O que me pareceu transparecer na conversa foi de que a herança que o Salazarismo deixou para Portugal é de uma incapacidade para se inserir no complexo cenário global atual. 




quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Supertubos

Dia 5 - Escrevo esse post, primeiramente, roendo minhas unhas de nervosismo com o jogo do Gremio x Liverpool - prestes a começar. Por outro lado me sinto tranquilo pelos amargos e mercenários terem deixado o clube, nem que seja nas vésperas da competição mais importante do ano. Quem tem Renato, Douglas e São Victor não tem nada a temer. 

Como o blog está com um pouco atrasado, continuo a cronologia da viagem e descrevo algumas impressões do quinto dia (ou seja, uns três dias atrás). Meu primeiro em Peniche foi bastante divertido, me enturmei bastante com o pessoal do albergue e passei a noite conversando a galera - dessa vez falar a língua local ajudou muito. A cidade muito é conhecida por ter sido uma penísula fortificada no século dezessete, mais recentemente teve o vergonhoso papel de principal prisão política da ditadura de Salazar e, atualmente, carrega o importante título de capital do surf de Portugal. Estava bastante entusiasmado por conhecer essa cidade culturalmente importante e, principalmente, a pesada Supertubos. 

Acordei cedinho para tomar um café da manhã e fui com um hóspede italiano de carro para a praia. Demos uma olhada por quase todas as ondas da redondeza e resolvemos cair em Super. A onda não inspirava muito, estava pequena mas sem crowd e o vento não interferia na formação. Surfamos por duas horas. Apesar da onda não ser aquela que vejo nos vídeos do Youtube, com direitas e esquerdas intermináveis, tubulares e pesadas, foi bom para voltar ao ritmo de jogo - a roupa de borracha grossa e o frio considerável são um desafio a cada caída na água. Às vezes é complicado ver que algumas manobras não saem como esperado, mas nada como um surf depois do outro. 

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Oceanário

Dia 4 - Há muitos anos, fui com meus irmãos no oceanário de Barcelona. O acervo de animais marinhos era incrível e a experiência me marcou muito. Fiquei sabendo que o oceanário de Lisboa era o maior e mais completo do mundo, então não tive dúvidas que seria essa a última atração que iria visitar na capital lusitana. Como este era o dia em que havia programado para ir para Peniche, fiz o check-out do albergue, guardei minha mochila e a prancha no depósito e peguei o metrô.

A hospedagem que escolhi foi no centro da cidade e por essa razão tive a impressão que a cidade de Lisboa era bastante voltada para a preservação do seu passado e de seus prédios históricos, com poucas referências modernas. Tudo na região central lembra um Portugal de outra época - forte, tradicional e pujante, com belíssima arquitetura, até mesmo com direito a castelos, monastérios e catedrais espalhadas pelo centro histórico. Por essa razão, ao desembarcar na beira da baía onde deságua o Rio Tejo, na região noroeste da cidade, o choque foi grande. Num espaço que lembrava muito o Cais do Porto, em Porto Alegre, o espaço público de lazer era moderno e muito bem estruturado. Com restaurantes, grandes prédios, ciclovias, atrações culturais, esculturas, estádio e centros comerciais, o pouco que eu vi da orla era bonito, novo e preservado. Senti uma pena que Porto Alegre demore mais de trinta anos para botar em pauta a reestruturação do velho e obsoleto Cais do Porto. 

O Oceanário se localiza na beira do mar, num prédio bastante grande. A entrada foi um pouco cara: onze euros para estudante, entretanto valeu muito a pena. O conceito principal é de um grande aquário onde a maioria dos animais habitam o mesmo espaço. Tubarões, penguins, arraias e os mais diversos animais marinhos nadam lado a lado, num ambiente, ao meu ver, no mínimo curioso. Há também inúmeros aquários individuais, onde se encontram as moradas de caranguejos gigantes (estes com mais de trinta centímetros de altura), polvos (bastante ariscos e com um tamanho considerável) e pequenos peixes fosforescentes do Índico (até mesmo encontrei o 'Nemo' por lá). Além de animais marinhos, há uma coleção extensa de rãs, sapos e lagartos dos mais bizarros. Inclusive as Lontras-Marinhas do Oceano Pacífico possuem morada no prédio - nais parecendo um Bicho-Preguiça, elas ficam relaxando e brincando entre si na água. 

No fim do dia peguei um ônibus para Peniche, com objetivo de buscar a lendária direita de Supertubos. 




segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Carcavelos

Dia 3 -  Com a roupa de borracha e a prancha em mãos, acordei cedo para comer um café da manhã do albergue e depois pegar um trem suburbano pra Carcavelos. A previsão não era das melhores, mas era essa hora que eu tanto esperava e fui ver um dos melhores picos de Portugal, ainda que com pouca ondulação, me reservava. 

A session de surf se desenrolou bem mais tranquila do que eu esperava. Apesar de ter passado cinco meses sem muito contato com o oceano, me senti bem na água e acabei por ficar por três horas surfando. As ondas não eram muito grandes mas possuíam muito mais qualidade que no dia anterior. Como era uma sexta-feira, os cafés e restaurantes estavam cheios e as pessoas caminhavam pela orla e o mar estava povoado. Apesar de haver umas trinta pessoas na água, havia ondas para todos e o clima na água era de respeito e de educação.

Quando saí do mar, nem mesmo precisei me vestir para me esquentar, apenas continuei com minha roupa de borracha pela cintura e me sentei para curtir o sol. Como tinha comprado alguns bolinhos de bacalhau e de nata em Lisboa, para não ter que gastar com nenhum restaurante caro de beira de praia depois do surf, comi tudo que tinha e fiquei mais de duas horas ouvindo música, vendo o tempo passar calmamente. No final da tarde ainda havia algumas ondas interessantes, com alguns bodyboarders mandando bem no line-up, mas decidi ficar relaxando até umas cinco horas da tarde. 

Voltei para o albergue depois disso, um pouco cansado mas bastante motivado e agitado pelo primeiro dia de surf, com direito até a algumas manobras fora de forma. Depois que me cobraram 4 euros numa cerveja no jantar do dia anterior, na Rua Augusta (que mais parece uma mistura de Rua dos Andradas com cadeiras e mesas no meio), fui reto comer no Kebab Istambul - onde a cerveja era 50 centavos na compra de um kebab. Depois de quase quarenta dias no Leste Europeu, e o meu dinheiro praticamente esgotado, comecei a entrar no modo econômico: surf, eat, sleep. Nesse dia, comecei a escrever sobre a viagem e a me disciplinar para postar no blog diariamente: afinal, essa é uma coisa no mundo que ainda é de graça.

domingo, 23 de janeiro de 2011

Lisboa

Dia 2 - Descolei três lugares onda achava que poderia achar o que precisava, fisgando informações do atendente do albergue, da internet e da Vert. Peguei minhas coisas e saí para a rua. Encontrei algumas lojas com apenas roupas de surf e etc, perguntei por umas informações de onde poderia achar equipamento de bodyboard e a unanimidade foi de que teria que ir para as praias para achar algo do gênero. Decidi então tentar a chance em Carcavelos - praia famosíssima pelo ocos tubos em areia compactada e água rasa.

Peguei um dos Comboios Suburbanos, trem este que vai de Lisboa até Cascais, passando por vários praias, entre elas Estoril e Carcavelos. Estava um dia ensolarado e fui com tempo de sobra, tendo em vista que saí bem cedinho de casa, já no ritmo de surf de acordar no raiar do dia e dormir bem cedo. No que tange minha missão de achar os acessórios que precisava a viagem foi um pouco frustante, pois é um lugar que clama por um carro para a locomoção e eu não tinha nenhum desses no bolso. Entretanto, como eu estava com minha câmera a tira-colo e as ondas não estavam boas o suficientes para me deixar chateado de não estar na água, passei parte do tarde caminhando e conhecendo a região. 

Apenas conhecia o lugar por vídeos de tubos absurdos no Youtube, porém o cenário que encontrei foi de um swel  pequeno demais para poder ver todo o potencial do pico. Outra informação que li num guia de viagem é de que a praia é muito poluída, especialmente quando a ondulação vem do Quadrante Sul. A região era tradicionalmente habitada pela elite de Lisboa até fins dos anos setenta, e após um boom na construção civil com o fim da ditadura e com a abertura econômica uma quantidade descomunal de esgotos começou a ser despejada no oceano sem qualquer tratamento - fato este que perdura até hoje, apesar da ação de associações de surfistas de proteção ao meio ambiente. 

Como era um quinta-feira, havia pouca gente e o clima era bastante ameno, com sol e pouco vento. No canto leste há um Forte do Exército, o qual não pude visitar pois é uma área restrita. Apesar de estar curtindo muito a praia, ainda precisava achar a prancha e o long, por essa razão comecei a perguntar por direções para surfistas e pessoas na praia, até que finalmente uma surfshop que era, literalmente, uma surfshop. Ou seja, nada de lindas pranchas de bodyboard para mim. A loja possuía alguns 'fatos' da Rip Curl, com zipper frontal e tudo mais, provei um dos longs mas acabei não gostando do modelo, muito menos do preço. 

Voltei para a praia e fiquei mais um tempo contemplando o lugar, sentado junto do Forte e pensando no dia seguinte, em que (provavelmente) já teria tudo em mãos e poderia passar o dia surfando no pico. Como no lugar não havia muito mais o que fazer, voltei para Lisboa para tentar achar minhas coisas até o fim do dia. 

Logo que voltei para Lisboa, entrei no metrô em direção à loja que não havia achado no dia anterior, pois descobri no Google Maps que na verdade ela se localizava junto ao metrô Campo Grande, ou seja, uma estação mais a frente de Alvalade, a estação que desembarquei no dia anterior. O mais engraçado da gafe na revista é que o erro foi cometido pelo próprio dono, que se confundiu ao descrever as direções da loja. Enfim, logo que achei o lugar, fiquei por quase duas horas escolhendo os equipamentos que mais se adequavam aos que iria encontrar em Portugal. Com um atendimento de alta qualidade, consegui achar o que eu precisava por um preço baixo, pelo menos a metade do que pagaria no Brasil. 

Para os poucos amigos que talvez se interessem pelas compras  em terras lusitanas, aqui vai uma breve descrição: 
Roupa de Borracha: Bodyglove modelo Fusion; 4:3; ziper frontal.
Prancha: Science modelo Mike Stewart; bloco 3D; 41,5.


Depois de um dia cansativo a vera, voltei para o hostel, tomei um banho e fui jantar qualquer coisa na rua. Como não podia comer outra coisa em Portugal além de peixe, pedi um bacalhau com batata e tomei uma cerveja bem gelada. Na sequência, caminhei até o hostel para - mesmo sem surfar - dormir de cabeça feita. 



Lisboa

Dia 1 - Finalmente cheguei em Lisboa para dar os primeiros passos de mais uma surftrip: o destino são as ondas cinco estrelas da costa lusitana. Apesar de não por perto amigos que gostaria de estar na companhia para desfrutar desses momentos memoráveis, trilho esse caminho de cabeça erguida e confiante - há tempos que Portugal é um destino sonhado e que nem achava que iria conquistar esse chão tão cedo.

Peguei o avião para cá vindo de Salzburgo. Passei dez dias na Austria, estes divididos entre Viena e Salzburgo, ambos lugares passados com meus primos do lado materno. Foram dias para organizar a viagem para Portugal, botar a cabeça em ordem e, também, finalizar a viagem pelo leste europeu que fiz com minha namorada no mês precedente.

Chegando no aeroporto de Lisboa, após a escala em Palma de Mallorca, tudo fluiu com muita tranquilidade. Logo que desembarquei fui direto para uma banca de revistas comprar uma edição da Vert, famosa publicação de bodyboard português. Para perguntar por direções, por uma vez estava em um país onde falo a mesma língua que os locais e foi facílimo achar uma condução para o centro e, em sequência, achar o albergue. Dessa vez, dei o 'pé-quente' de ter reservado um lugar confortável, limpo e barato.

Consegui fazer o check-in ainda pelas quatro da tarde, por isso decidi dar uma volta pelo centro histórico ainda com um pouco de luz do dia e tive uma sensação engraçada: após alguns momentos de caminhada parecia fazer sentido de pensar que uma boa parte da miscelânea que é o Brasil é oriunda dessa terra. Em alguns momentos Lisboa chega a lembrar o Rio de Janeiro. Tenho dúvidas se essa impressão minha se dá pelo fato de ambas cidades terem as clássicas calçadas de pedras em preto e branco ou pela semelhança dos centros históricos, ou ainda por um fator que não consigo lembrar ou identificar... Enfim, a cidade é fantástica, mas não aguento mais a sede de surf: de turismo mesmo aqui na capital portuguesa irei somente no Oceanário, que parece ser fantástico - o foco vai ser total no bodyboard.

O primeiro desafio era achar os equipamentos que me faltavam: uma roupa de borracha 4:3 (mais conhecido em Portugal como 'fato') e uma prancha de bodyboard (esta popularmente chamada de 'tábua'). Folhando a revista recém comprada, tive o prazer de encontrar uma grande lista das lojas com maior e melhor qualidade de equipamento em toda Portugal e, após uma olhada geral, peguei o endereço da única surf shop de Lisboa listada e me mandei. Nem mesmo peguei o endereço exato, acabei esquecendo, mas sabia que na descrição dizia "junto a estação de metrô de Alvalade" e por isso não me preocupei.

Desembarcando na dita estação, procurei pela loja e nada. Andei em várias direções sem sucesso e depois de meia hora acabei por desistir, estava morrendo de fome e fui jantar um saboroso peixe num restaurante qualquer: para o meu refestelo o peixe-espada com batatas estava fresco, saboros e foi muito barato. Voltei para o albergue e pesquisei por outras lojas, sem muito aparente sucesso em obter informações sobre surf shops na região.